Cerca de metade da classe média tradicional brasileira está chateada
com o aumento da fila nos cinemas (62,8%), quer produtos com versões
diferentes para ricos e pobres (55,3%) e acha que a qualidade dos
serviços piorou pelo aumento da demanda (48,4%). O motivo: tem mais
gente com dinheiro para consumir o que antes era restrito a poucos
abonados.
A má notícia para os descontentes é que esse pessoal, a
nova classe média ou classe C, se consolidou como a maioria da população no Brasil – e, por consequência, tem cada vez
mais peso para decidir sozinha quem deve administrar o município, o
estado e o país.
As reclamações foram captadas por uma pesquisa do Data Popular,
consultoria especializada no comportamento desses emergentes. O mesmo
estudo, feito no ano passado, também elencou os oito principais valores
na nova classe média. Pelo menos três deles são essenciais para entender
como o grupo encara a política: a ligação com o bairro e a vizinhança, a
batalha para educar os filhos e a tomada de decisões a partir de
informações e opiniões de confiança.
Assim como a elite, no entanto, os políticos em geral também não
entendem a nova classe média. “Existe uma dissonância cognitiva. O que
é curioso é que a nova classe média se integra bem melhor com a
iniciativa privada do que com o poder público e os políticos em geral”,
diz o sócio-diretor do Data Popular, Wagner Sarnelli.
O problema, segundo ele, está ligado ao fato de que as pessoas que
deixaram as classes D e E não sentem os efeitos práticos da política
como sentem os do consumo. Além disso, a maioria vê a política com um
aborrecimento.
Sarnelli cita dados sobre otimismo do Data Popular para justificar a
tese. Nas regiões Sul e Sudeste, onde os emergentes são considerados por
ele como mais politizados, três a cada quatro representantes da nova
classe média acreditam que a vida vai melhorar no futuro, enquanto no
Norte e Nordeste a proporção dos otimistas é de quase nove para dez.
Outro motivo para o distanciamento da política é temporal.
Especialista em pesquisas eleitorais, a cientista política da
Universidade Federal do Paraná (UFPR) Luciana Veiga diz que é necessário
dissociar o comportamento da nova classe média na hora de votar e na de
consumir. “A classe C de hoje já estava inserida no processo eleitoral
quando fazia parte das classes D e E. A mudança de comportamento
político é muito mais lenta que o de comportamento de consumo”, opina a
pesquisadora.
Números do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas
(FGV) comprovam que a classe C cresce constantemente desde meados dos
anos 1990, mas só atingiu a maioria da população brasileira em 2009
(veja as informações no infográfico). Por outro lado, as eleições
diretas para prefeito já haviam sido retomadas em 1985.
A falta de identificação com a política tradicional, contudo, não
quer dizer que a nova classe média está alheia ao processo eleitoral.
Consultor político e professor de Comunicação Política da Universidade
de São Paulo, Gaudêncio Torquato define a lógica de escolha dos
emergentes como uma questão de “geográfica corporal”. Segundo ele, o
mapa da decisão começa no bolso, passa pelo estômago, chega ao coração e
termina no cérebro.
Ou seja, a partir do momento em que as questões básicas de
sobrevivência estiverem resolvidas, as decisões eleitorais da nova
classe média serão mais elaboradas. Torquato ressalta que a ascensão
social só faz bem à democracia brasileira. “O acesso ao consumo que
essas pessoas tiveram nos últimos anos leva inevitavelmente a uma
absorção de novos conhecimentos e à elevação dos seus padrões de
cidadania”, diz o consultor.
Os prognósticos dele são imediatistas. Para Torquato, as disputas
municipais de 2012 serão as eleições da classe C. “O candidato que
souber entrar na micropolítica da nova classe média, dedicar-se às
questões locais, com certeza é o que vai ter mais sucesso.”
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